ENTREVISTA COM O TÉCNICO GUERRINHA
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Nascido na capital
do basquete brasileiro - Franca - Jorge Guerra, o
Guerrinha, foi campeão brasileiro como técnico do Bauru em
2002 e campeão do Rio de Janeiro com Campos em 2003. Além
disto, foi jogador da seleção brasileira por mais de dez anos,
participando da histórica conquista do Pan-americano de 1987.
Nas linhas abaixo, Guerrinha irá analisar o desempenho da
seleção brasileira na Copa América Sub21, a qual ele dirigiu,
e também o processo de formação de talentos em nosso basquete.
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BBHEART: A que você atribui a nossa segunda desclassificação
seguida para o Mundial da categoria?
Guerrinha:
São vários os motivos.
As demais equipes se apresentaram com as suas forças máximas
(Porto Rico trouxe até o jogador que acabou de ser draftado, não
sendo liberado para participar das famosas summer leagues, que
todo jogador brasileiro é obrigado) tornando a competição
desnivelada em relação ao nosso time. Além disto, as equipes que
terminaram na nossa frente já fazem o trabalho integrado de
filosofia de jogo com a seleção principal de seus países no mínimo
há cinco anos. No Brasil iniciamos esse trabalho há dois meses. A
equipe venezuelana participa da Liga Superior de seu país
representando um clube para adquirirem conjunto.
Nas categorias de base existe um trabalho para o jogador aprender
(entender) os fundamentos e os conceitos de jogo, diferente do
Brasil, onde o que importa é ser campeão a qualquer custo. (eu
também tive minha formação como jogador voltada para ser campeão,
mentalidade herdada do futebol).
Sugiro que seja feito com urgência um programa de formação dos
técnicos de iniciação e das equipes de base com no mínimo três
clínicas de estudos obrigatórias por temporada. O treinador que
não participasse das mesmas não estaria habilitado para trabalhar.
(O Flavio Davis tem um projeto pronto muito bom que a Federação
Mineira já está executando). As federações deveriam padronizar
seus procedimentos em relação às categorias de base com o objetivo
do jogador aprender os fundamentos. Por exemplo, a categoria mini
e mirim ter a opção de ter 3 x 3 para a bola passar nas mãos de
todos os jogadores. Nas demais só sendo permitida a marcação
individual durante os três primeiros quartos do jogo. Em caso de
falta e cesta, o jogador ter direito aos lances livres e mais a
posse de bola (para o atleta brasileiro se acostumar a jogar com
contato físico), entre muitas outras sugestões...
Como você avalia o trabalho que vem sendo efetuado nas categorias
de base em todo Brasil?
Como tudo no
Brasil muito na base do amor e sacrifícios pessoais, sem uma
política governamental de esporte no geral. A iniciação esportiva
deveria ser direcionada para as escolas, cabendo a competição para
os clubes (que é uma cultura no nosso país e não podemos tirar).
Além das clinicas para professores e treinadores citadas acima.
Você não acha que deveria existir uma política de descoberta de
talentos? Festivais de basquete pelo Brasil, por exemplo.
Sem duvida,
primeiro a massificação e depois o direcionamento dos talentos em
clinicas e acampamentos. Existe um programa na CBB elaborado pela
comissão técnica do masculino e do feminino quando estivemos
reunidos em DENVER -USA, o qual pudemos realizar apenas a
primeira etapa na temporada passada. Quando houver uma verba
específica para esse projeto ser realizado por inteiro e estendido
para todo o país, obteremos resultados expressivos em médio prazo,
com certeza.
Como você avalia nossa seleção em relação às demais?
A baixo das
principais do torneio mas com muito espírito de luta e dedicação
de todos envolvidos no objetivo para trazer a classificação para o
Brasil. Se estivesse completa, nossa seleção estaria no mesmo
nível das demais com exceção dos USA e as forças da Europa
(Croácia, Sérvia, Lituânia, etc).
Quem foram os destaques do torneio?
No Brasil, Caio
Torres (se trabalhado na sua condição física será em breve mais um
brasileiro na NBA - muito talentoso), Douglas e o Marcus.
Nas outras seleções:
Porto Rico: Peter Ramos(pivô draftado pela NBA com 2,21) e o
armador Barea (jogador completo – em todos os jogos obteve médias
próximas as 10 assistências,10 rebotes e 20 pontos).
Argentina: O lateral Sandez, o armador Figueroa e o conjunto da
equipe.
EUA: No mínimo seis jogadores que estiveram aqui estarão em breve
na NBA.
Canadá: É uma boa equipe favorecida pelo sorteio dos grupos para a
competição.
Venezuela: Palácios, um ala forte, Marriaga, um pivô 4 com bom
trabalho de quadra e o lateral armador Cerdeno.
O que você identificou como diferencial entre os jogadores das
equipes mais fortes em relação a nossa ?
O jogador
brasileiro no geral, por estar acostumado a atuar em nosso
basquete, não sabe jogar com contato. Ou perde a cabeça e parte
para briga ou perde o foco coletivo do jogo. A arbitragem no
Brasil apita muitas faltas que são ignoradas no basquete
internacional. Este procedimento cria no jogador brasileiro
facilidades para jogar internamente. O problema é que quando
expostos às competições internacionais, nossos atletas se
desequilibram emocionalmente passando a se perder individualismos
ou improvisos, se esquecendo que o basquete neste nível é um jogo
em que as ações individuais devem estar em sincronia com o
coletivo. Outro fator importante é entender dos conceitos de jogo.
Fazer a leitura do momento do jogo. Nosso jogador está acostumado
a fazer o que deseja não importando a situação da partida. Este
processo de aprendizagem deveria ser trabalhado lá na sua
formação.
Você acha que com o Marquinhos e com o Tiago o resultado seria
diferente?
Se analisarmos
o regulamento da competição, que previa a passagem de duas equipes
de cada grupo para as semifinais. E que perdemos para P. Rico
(COMPLETO) na prorrogação, ganhamos da Venezuela na primeira fase,
perdemos para os EUA num bom jogo e os dois finalistas da
Competição saíram do nosso grupo, certamente estaríamos no próximo
mundial.
Espaço aberto para suas considerações finais:
Gostaria de
agradecer o espaço dessa entrevista para poder dividir as nossas
experiências vividas com muitas dificuldades e falar que me sinto
muito gratificado por tudo que realizamos nesses dois meses, onde,
como técnico, tive todas as condições da CBB para desenvolver o
meu trabalho. Gostaria de ressaltar o alto nível da comissão
técnica, não só no aspecto profissional, mas, principalmente, no
aspecto humano. Não conseguimos a classificação para o Mundial,
mas vamos colher os resultados no futuro de outra forma. Por
exemplo, transformando nossas vivências em ações e sugestões, e
não em justificativas ou críticas destrutivas que nada acrescentam
ao nosso maravilhoso BASQUETEBOL BRASILEIRO. As pessoas no Brasil
não têm a noção de como o Basquetebol Brasileiro é admirado e
respeitado a nível internacional. Tenho a honra de ter participado
como jogador e agora como treinador deste processo e, por isso, me
sinto uma pessoa privilegiada de ser Brasileiro e ser do Basquete
Brasileiro.
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